domingo, 7 de setembro de 2014

Quanto tempo dura um piscar de olhos?

Isso depende, na verdade varia, e não tem necessariamente nada a ver com o momento em que nossos cílios se entrelaçam e se despedem novamente. Tem a ver com o flashback que nos proporciona. Eu explico.

 

Na última piscada que eu dei eu estava sentado na beira da piscina de casa, com minha família, minha namorada, e alguns amigos, e não podendo deixar de mencionar, com a Sol de um lado e a Cheeta do outro, disputando meu carinho, parecendo preverem o que estava pra acontecer em algumas poucas horas.

Quando eu abri o olho eu já estava a 9.000km de distância e uma semana à frente no tempo, descendo uma ladeira num céu laranja sendo engolido por uma nuvem roxa. Considero todo pôr do sol especial, mas os de domingo são mais. Tenho isso comigo desde bem criança, quando num final de tarde dominical, na frente da casa da minha querida vó Neuza, ela disse: “é meu filho... mais uma semana que se vai”, e lá se foram, na verdade, vó, anos e anos. Desde então, todo domingo, quando cai a noite, eu me lembro dela e desse seu comentário, que sempre me fez refletir sobre a fúria do tempo. Foi quando eu decidi sentar aqui pra escrever sobre.

 

No curto espaço de um milésimo de segundo se passaram 7 dias, nos quais eu fui mais um vez ao meu lugar favorito na cidade do Rio (o Aeroporto Internacional); enfrentei mais um voo de mais de 10 horas; peguei um ônibus carregando 4 bagagens; reencontrei a querida Promenade des Anglais, onde havia desembarcado do mesmo ônibus há 4 anos, com menos bagagem (de viagem e cultural), mas, igualmente, sem saber exatamente como chegar ao devido apartamento; me instalei numa nova “casa” (que não posso devidamente chamar de casa, uma vez que tem o mesmo tamanho do quarto que eu deixei no Brasil); fiz compra semanal, pois mensal não tenho como carregar nem subir as escadas; almocei com um amigo e conheci seu filho, Felipe Massa; fui à Itália (que fica a meia hora de Mônaco) só porque não tinha nada pra fazer e queria tomar um gellatto como sobremesa; me empolguei com a organização e alto nível da minha nova universidade (International University of Monaco); fiz novos amigos de algumas nacionalidades diferentes; sofri com a greve de trem; encontrei um tatame pra treinar; fui a festa; chorei; ri; e liguei o ventilador a noite, mesmo sem estar com calor, só pro barulho não deixar a solidão falar muito alto e me deixar dormir melhor.

 

Na penúltima piscada que eu dei, voltei pro ano de 2010 e recordei alguns dos muitos momentos que vivi aqui em Nice durante um mês e na consequente Eurotrip de dois meses, memórias que um post não seria capaz de enumerá-las, um livro talvez será...

 

Ontem numa festa tradicional, com muita música, dança e barraquinhas de comida típica, ocorreu um belo show de fogos de artifício e naquele instante em que a pólvora explodia multicoloridamente no ar me lembrei de um dizer escrito numa camisa minha: “toda explosão é uma nova criação”, numa alusão ao Big Bang, a primeira grande explosão de todas, mas que se aplica a tudo na nossa vida. Pra vir pra cá, deixei pra trás, ainda que momentaneamente, minha família, minha namorada e alguns amigos, e não podendo deixar de mencionar, a Sol de um lado e a Cheeta do outro, disputando meu carinho, parecendo preverem o que estava pra acontecer em algumas poucas horas... o que pode ser considerado de certo modo uma “explosão”, uma ruptura, mas que se fez necessário para que uma nova criação viesse a ocorrer. Deixei pra trás também o meu quarto (que é do tamanho da “casa” que eu tô morando agora), indubitavelmente estou fora da minha zona de conforto, mas definitivamente estou prestes a criar, conquistar, algo que minha zona de conforto jamais me proporcionaria. E que bom que essa explosão se deu antes que eu piscasse e ao abrir os olhos, visse no espelho um homem de cabelo grisalho.

 

Gostaria de terminar esse post com cinco frases, que não são minhas, mas que as tenho como lema... sugiro a reflexão, preferencialmente com os olhos “piscados”:

 

1)    As pessoas reclamam por ter os mesmos “fins”, sem perceber que realizam os mesmos “meios”.

2)    O futuro pertence àqueles que acreditam na beleza dos seus sonhos.

3)    Não sabendo ser impossível, foi lá e fez.

4)    Quem ousa vence.

5)    Deus proverá.





sexta-feira, 20 de junho de 2014

Efeito Borboleta

O bater das asas de uma borboleta pode influenciar o curso natural das coisas e, assim, talvez provocar um tufão do outro lado do mundo...esta é a forma mais popular de explicar (ou entender) o Efeito Borboleta, que se insere na Teoria do Caos, mas que de forma mais coloquial quer dizer que os mais simples acontecimentos podem gerar eventos de proporções colossais. E é sobre isso que venho falar hoje: como um olhar de relance à quilômetros de distância de casa pode te levar a uma abertura de copa do mundo no seu país. Era agosto de 2010, eu estava numa pequena ilha da Croácia chamada Pag, mais especificamente em Novalja, na praia de Zrce. Eu e meu irmão tínhamos pulado pra dentro de um beach club e também pra dentro da área vip. Iniciamos nossa "volta" de reconhecimento e por estar muito cheio, eu fui na frente e meu irmão vinha logo atrás. Foi nesse momento que meu irmão puxou minha camisa e disse: “Leo, vem aqui agora! Vem ver essa mulher!!!”, de cara eu neguei, mas a insistência dele foi tão grande que eu resolvi conferir. Ela estava num pequeno camarote acompanhada de um amigo, e logo depois chegaria o seu namorado, Tomislav, um cara gente finíssima, que desde o início demonstrou imensa simpatia e hospitalidade comigo e com meu irmão. Sem querer querendo acabamos passando a noite toda ali com eles três, e quando já eram quase 6 da manhã, ele pediu pra que eu anotasse o seu telefone e ligasse ao acordar, para que pudessemos nos encontrar naquela mesma praia, onde nos apresentaria outro amigo que estava vindo de outra ilha passar o domingo com eles. Se tratava de Ivan Debeljak, um dos cara mais gente boa que já conheci na vida e que em 5 minutos eu já sabia que se tornaria um grande amigo nosso. Dito e feito, aquela tarde que passamos na praia e posteriormente no Papaya Beach Club (o mesmo que estávamos na noite anterior) foi o suficiente para trocarmos os contatos e prometermos uma visita a Vodice, ilha na qual ele estava trabalhando durante aquele verão. Como somos homens de palavra, alguns dias depois lá estávamos chegando para passar dois dias ensolarados sob os cuidados de Ivan, que nos arranjou apartamento, comida e entretenimento. Ao me despedir dele e do meu irmão (que ainda seguiu viagem e conheceu outras três ilhas com ele) o fiz prometer que me visitaria no Brasil para que eu pudesse retribuir toda sua hospitalidade. Ele prontamente aceitou, jurando que o Rio de Janeiro era o destino com o qual ele mais sonhava em conhecer. De lá segui meu caminho Europa à dentro. Um ano depois eu recebi a grande notícia de que ele estava com tempo e dinheiro para vir ao Brasil passar umas duas semanas, e além disso, perguntou se poderia trazer um amigo (que nem eu nem meu irmão conhecíamos) e que também sempre quis conhecer nosso país. Eu confesso que fiquei um pouco ressabiado, pois nunca se sabe né, vai que o cara é um pé no saco... mas meu irmão confiou na noção do Ivan, até mesmo por tê-lo conhecido por mais dias do que eu, e estava certo de que o amigo dele seria tão legal quanto ele. Meu irmão estava mais do que certo, pois se tratava de Zvonimir Sedlic (que eu logo tratei de apelidar de Zuzu, pra simplificar pra todos), um dos seres humanos mais extraordinários que já conheci, um cara de espírito elevado, alegria contagiante e generosidade sem fim. Sem sombra de dúvidas está no topo da lista dos meus melhores amigos. As duas semanas que nós quatro passamos aqui no Rio foram de diversão interminável, e principalmente de estreitamento de amizade, o que é mais importante. Em 2013,resolvi que era hora de retornar à querida Croácia, perto de completar 3 anos desde a minha primeira visita. Lá passei 20 dias excepcionais, mais uma vez com a hospitalidade de Ivan e toda atenção possível de Zuzu. Pude conhecer suas famílias e outros amigos, além de suas casas e seu jeito de viver. À esta altura já não éramos mais amigos, e sim irmãos. Um detalhe interessante foi poder perceber que Zuzu se tornara o seu apelido oficial, mesmo entre àquelas pessoas que não me conheciam, inclusive a sua namorada. O batismo que realizei na beira da piscina da minha casa em frente a churrasqueira, cruzou o oceano e se auto registrou em algum cartório de Zagreb. E todo esse efeito cascata que eu estou contando teve como seu maior divisor de águas o dia 06/12/2013, quando no sorteio da fase de grupos da Copa do Mundo de 2014, o Sir. George Hurst, sorteou a bolinha que continha o nome da seleção que enfrentaria o Brasil na abertura da Copa. E eis que Jerome Valcke revelou para milhões de espectadores o papelzinho com o seguinte nome: CROATIA. Não tive outra reação a não ser gargalhar e pegar meu telefone pra ligar pra Ivan e Zuzu. Foi uma comemoração digna de gol. Logo de cara, sem nem dizer alô, Zuzu já foi logo dizendo: me parece que te visitarei em alguns meses. Não somente, viria munido de tickets, alheio a especulação de impossibilidade da compra dos tais que inundava o Brasil àquela altura. Eu mesmo, confesso que nem tentaria comprar ingressos, tamanha incredulidade. Porém, por que a vida é bela, 16% dos ingressos de cada partida são reservados para os cidadãos das respectivas seleções a jogar (8% para cada), ou seja, dos +- 65 mil ingressos à venda para o jogo de abertura, cerca de 5000 seriam exclusividade dos croatas, e analisando o tamanho de sua população e o número de pessoas aptas a virem ao Brasil durante a copa, esse era um número animador. Além disso, não satisfeito em ser cidadão croata, Zuzu é membro da Associação Croata de Futebol, o que lhe dava preferência de compra, nos dando 99% de certeza de ter ingressos. E o tempo elevou essa porcentagem para 100%, quando ele conseguiu não somente um par de ingressos, mas meia dúzia, para que pudéssemos assistir ao vivo ao evento de maior audiência no mundo que só ocorre a cada 4 anos (sim, a abertura da copa é mais assistida do que a própria final). E como havia ocorrido em 2011, quando o Ivan pediu permissão para trazer um amigo, dessa vez, em 2014, Zuzu pediu para trazer três (que eu não conhecia) Diferentemente da outra vez, agora nem titubeei, dei o Ok no ato, certo de que eles seriam da mesma "categoria" de Zuzu e Ivan (este que infelizmente não poderia vir por motivos de trabalho). Enfim... O tão sonhado dia 12/06/2014 chegou e lá estávamos, em São Paulo, eu, meu irmão, Zuzu e seus (agora também nossos) amigos croatas, prontos para ver não só o jogo de abertura entre nossos países, mas também toda aquela festa que ocorria, seja extra oficial, ainda fora do estádio, como a da FIFA, do lado de dentro, que foi sim bem bonita e emocionante, ao contrário do que todos os haters cornetaram nas mídias sociais. De quebra, ainda matei saudade dos meus tempos de guia de turismo e levei minha turma de croatas pra Manaus (eleita a melhor cidade sede da Copa), para que assistíssemos ao duelo entre Camarões e Croácia. Obviamente aproveitamos para também conhecer a floresta amazônica e muitos dos seus encantos: encontro das águas, rios, vegetação, boto cor de rosa, preguiça, cobra, jacaré, aldeia indígena etc... Um velho desejo que só realizei ao receber a visita de 4 amigos europeus, ironia do destino, mas a vida tem dessas coisas. Foram 12 dias de muita amizade, alegria, gargalhadas, aventuras e viagens... Nesse momento eles estão num voo da KLM, rumando ao velho continente, e certamente já deixaram saudade. Porém a grande conclusão desta viagem feita em casa é que da mesma forma que o bater de asas de uma borboleta pode causar um tufão do outro lado do mundo, um simples olhar sugerido pelo seu irmão pode te colocar num jogo de abertura da Copa do Mundo.

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

Dúbia Dubai

E lá se foram 14 horas divididas entre um bom sono, "leitura" de jornal, alguns filmes, muita comida e bebida, joguinhos, caminhadas e visita ao amigo Bogado... finalmente estávamos aterrissando no aeroporto de Dubai. Levemente meu coração começava a palpitar conforme ia chegando a hora da imigração, mesmo sabendo que os Emirados Árabes não tinham grandes restrições para entrada de brasileiros ou estrangeiros em geral, sem querer eu acabei me metendo num imbróglio documental que poderia ser causador de algum problema caso o agente de imigração estivesse de mau humor. Pra quem não se lembra, eu precisei tirar um novo passaporte (para poder entrar na Jordânia) após ter tirado o meu visto pros Emirados Árabes, e este, era eletrônico, uma simples folha de papel impressa diretamente da internet constando os números de série em referência ao meu antigo passaporte que havia sido invalidado no instante em que eu solicitei o novo. Ou seja, o cuidado que eu tive para entrar na Jordânia sem problemas, poderia ter um efeito reverso e culminar com a minha não entrada nos EAU e consequentemente na própria Jordânia.

A hora da verdade chegou e meu impulso me fez tentar algo arriscado, mas genial: eu entreguei primeiro o e-visto, e em seguida o passaporte invalidado, que na verdade estava com a vigência em dia (o que o tornara invalidado era apenas um furinho na capa, que eu tratei de disfarçar com uma capa para passaporte.). O agente, trajando a típica roupa árabe e uma pomposa barba, checou os dados o visto, deu uns carimbos, e então começou a folhear meu passaporte, e para isso dedicou certo tempo, vide o numero de folhas carimbadas que ele possuía, e isso foi muito bom, pois agregou valor a minha condição de viajante. Estava comprovando, através do preto no branco, que não era um imigrante ilegal em potencial, e sim um viajante de carteirinha. Após ter folheado todas as páginas, com a mesma expressão cerrada, ele fechou o passaporte, quando para o meu desespero percebeu o furo na capa, me olhou de cara feia e botou as palmas da mão pra cima como quem diz: mas o que que é isso? Minhas pernas começaram a bambear, minha boca começou a balbuciar uma resposta, enquanto ele já virava a cadeira para chamar um superior que estava de passagem. Nisso Bogado me olhou com os olhos esbugalhados, principalmente por não saber do meu problema nem da minha jogada (preferi não contar a ele antes pra não deixa-lo com um nervosismo aparente, nem ficar pensando no pior e atrair uma energia negativa). Quando o superior se aproximou eu já estava sacando o novo passaporte, mas já com a certeza de que toda aquela viagem dos sonhos estava boa demais pra ser verdade e eu seria mandado de volta pra casa/realidade. Para o meu alívio, assim que o superior viu o novo passaporte, fez cara de “ta tranquilo, pode carimbar e passar, welcome to dubai”, eu por dentro desmoronei em refrigério, mas por fora mantive a cara de “ah, desculpe, são tantos passaportes que me confundi e entreguei o errado.. haha que tolice a minha”. Bogado com os olhos de castor não sabia se ria ou se chorava e eu sugeri que ele se afastasse e fosse em direção à esteira das malas. O agente deu seu carimbo com um olhar de “tava doido pra te barrar, mas tua barba está de respeito, então pode passar e vá com Alá”. Realmente eu estava com uma puta barbona cultivada estrategicamente há semanas para ser melhor recebido nas arábias.

Após pegar as malas na esteira bem espaçosa e eficiente, sem o clássico empurra-empurra, rumamos para o lado de fora para pegarmos o taxi. Ao sairmos tomamos um “soco” na cara... sem exagero nenhum, a sensação era de ter entrado numa sauna seca. A temperatura devia estar pelo menos uns 20 graus celsius acima do interior do aeroporto (+- 21ºC), e detalhe, eram onze horas da noite!

Os minutos seguintes foram de um puro e simples deleite, mas digno daqueles comercias de grandes bancos internacionais que vemos em aeroportos e revistas de negócios: pela janela do taxi luzes frívolas cruzavam meu olhar, as placas de trânsito eram diferentes, a música árabe na rádio, o motorista era indiano e gentilmente ia explicando a área por onde passávamos num inglês quase incompreensível. Imaginem a cena de uma câmera dando um take no meu rosto com os olhos brilhando e um sorriso que deixava escapar através da janela, e então ela vai se distanciando, revelando a imensidão da cidade, até que já pequeno e distante o nosso taxi se mistura na multidão de outros carros que passam em alta velocidade. (não disse que era digno de propaganda de tv?), pois foi justamente isso que vivi, apenas com a ausência da câmera.

(pros que não conseguiram imaginar, foi algo mais ou menos assim:http://www.youtube.com/watch?v=fUTl1f24zIo ).

 

Eis que de repente, surge no horizonte, algo que fazia mais que arranhar, algo que rasgava o céu, nada mais nada menos do que o famoso prédio Burj Al Khalifa, o mais alto do mundo, mais um superlativo para a coleção de Dubai. A visão até que é descritível, mas a sensação de estar diante daquela monstruosidade construída pelo homem me deixou em dúvida se era verdade ou miragem, fiquei atônito até perde-la de vista. Estava sendo bem-vindo pela dúbia dubai.

 

Chegando ao hotel, que era um pouco distante do centro, mas compensava por ser na Praia de Jumeirah, e além disso taxi por lá é barato, fomos conhecer a área da piscina, que desembocava na areia e no mar. De repente Bogado levou um susto com um movimento que veio dos arbustos, e gritou: “que isso que isso?! É um gato? É um bicho árabe??” De fato ele estava certo, era um gato, e árabe, realmente estranho, magricelo, sem pelos, cara diferente de tudo que estávamos acostumados, afinal de contas era sim um bicho árabe.

 

Depois desse reconhecimento, fomos encontrar um “amigo” meu, e Bogado me indagou: “porra mano... até nas Arábias você tem amigo?”. Na verdade se tratava de Amr Salama, sujeito gente boníssima que eu tinha conhecido no Couch Surfing, quando estava à procura de maiores informações (reais e locais) a respeito de Dubai. Amigavelmente ele se ofereceu pra nos fazer um tour, e na hora marcada ele apareceu lá a bordo do seu golf turbinado. O cara era amante de automobilismo e mostrava com orgulho o som do motor do seu carro. Na hora eu e Bogado nos olhamos, dizendo que meu irmão adoraria estar ali, por razões óbvias.

O tour noturno foi curto pois estávamos muito cansados e Amr Salama também precisaria acordar cedo no dia seguinte. Mas valeu para conhecermos um lugar ou outro, como por exemplo a península em formato de coqueiro (vista do alto) e o gigantesco hotel Atlantis. Finalizamos com um lanche bem típico, no qual infelizmente não pude experimentar o sanduiche de cérebro de cabrito, pois esta iguaria estava em falta, mas o que comi que já não lembro o que foi, valeu como minha primeira experiência gastronômica árabe.

Depois disso foi dormir e esperar o dia raiar no horizonte do deserto.

 





terça-feira, 5 de novembro de 2013

Uma boa palavra alegra o homem abatido...

...assim diz o provérbio 25 do capítulo 12, e é bem verdade, comprovada neste domingo, quando esbarrei com um amigo que há muito já não via. Ele, que sempre foi muito alheio às mídias sociais, para minha grata e imensa surpresa era fã e seguidor do meu blog! Ele me indagou o porquê de ter parado de escrevê-lo, e eu simplifiquei dizendo que não estar em uma viagem me desanima a escrever, me tira a inspiração e a riqueza de detalhes cai em resumos. Felizmente ele me animou, dizendo que isso era bobagem, que eu tinha "obrigação" de seguir compartilhando com meus amigos as minhas aventuras de tantas viagens já realizadas. Refleti a respeito e cheguei a uma conclusão: o que é escrever senão viajar novamente?! Logo, ao escrever eu estou sim viajando, e a cada frase completada uma emoção é revivida, e o próximo parágrafo é só uma questão de digitar.

> Para (re)fazer algo só é preciso (re)começar, e assim sendo, cá estou, (re)viajando através das palavras.
> O momento para esse incentivo não seria mais oportuno, pois há exato 1 ano eu estava praticamente do outro lado do mundo, senão geograficamente, com certeza no que tange os costumes, religiosos e culturais: estava "nas arábias"! Certamente esse ciclo de 12 meses aflorou em mim todas as memórias que vivi há tão pouco tempo, mas que num piscar de olhos viraram passado e mais 2 alfinetes no meu mapa.
> Tudo começou de repente, quando meu avô não se resignou ao ser deixado de lado em uma viagem que seu filho e esposa (meu tio e minha avó) fariam a Dubai e Turquia, e decidiu então ir sem eles para Dubai e Jordânia. Contudo, sozinho ele também não iria, uma vez que sua idade e pouca pró-atividade não mais permitiriam, e foi nessa falha do sistema que a sorte me sorriu! Fui eleito para levá-lo às arábias, graças a minha fluência no inglês (que ele tanto se orgulha pois foi o primeiro a me ensinar as primeiras palavras do idioma) e também nossas bem-sucedidas experiências de viagens juntos (em 2011 eu cuidei dele minuciosamente durante nosso passeio por madri, barcelona e ibiza).
> Quando ele me apresentou a proposta, que dispensou resposta, imediatamente eu tratei de pesquisar tours que atendessem aos seus desejos e necessidades, e por sorte ou encargo do destino, uma agência a poucos passos do prédio em que meu avô mora trabalhava com uma operadora especialista em oriente médio. Sabendo de suas guinadas e mudanças de idéias, tratei de logo me informar de tudo que fosse preciso pra o quando antes arrematar o negócio. Com a graça de Deus (ou Alá), em poucos minutos de conversa fiquei sabendo de tudo que era preciso e voltei pra contar ao meu avô, que tomado pela empolgação quis retornar na mesma hora para fechar o pacote da viagem. Chegando na agência, sua empolgação aumentou e ele decidiu investir ainda mais no seu próprio conforto e optou pela classe executiva.
> Após o acerto de valores, e algumas poucas burocracias de visto, certificado de vacina, seguro-saúde etc, foi só planejar e esperar o grande dia chegar. Ocorre que se conquistar fosse fácil, não existiriam grandes vitórias. E numa das minhas pesquisas eu descobri que para entrar na Jordânia um brasileiro não precisaria de visto, porém seu passaporte precisaria ter uma validade mínima de 6 meses a contar do dia de entrada. Fui conferir meu passaporte só por desencargo de consciência, e para meu desespero (e alívio por ter descoberto a tempo) o meu venceria em 5 meses após nossa data de entrada. Conclusão, tive que tratar de renová-lo. Decidi marcar minha renovação para a PF do Galeão, pois as datas seriam anteriores as da PF de Niterói. E como emoção demais nunca é suficiente, a Polícia Federal tratou de entrar em greve poucos dias antes da minha data... Isso mesmo, a Polícia Federal do Brasil estava de greve!! Mesmo assim resolvi arriscar e fui lá, pois tinha ouvido que alguns casos extraordinários estavam sendo atendidos. Chegando lá, tentei fazer meu caso parecer extraordinário sem o menor sucesso, e fui mandado de volta pra casa sem a menor cerimônia. De forma resumida, eu fui de itacoatiara a ilha do governador QUATRO vezes até finalmente ser atendido, por "misericórdia" de um policial que viu meu semblante abatido após seguidas negativas e ao perceber minha carteira de guia (estrategicamente) pendurada no pescoço se sensibilizou e com uma palavra amigável disse que me atenderia. Fato é que aquela espera que durou cerca de 3 semanas só fez aumentar minha expectativa se o passaporte ficaria pronto a tempo, pois uma zona de conforto confiável de quase um ano para a sua expiração, de repente virou uma corrida contra o tempo. Felizmente Alá intercedeu e meu documento ficou pronto a tempo. Vale lembrar que meu e-visto pros Emirados Árabes já havia sido emitido com referência ao passaporte que agora estava invalidado, só mais uma pitadinha no meu imbróglio.

Passado esse perrengue, faltavam poucos dias para o embarque e eu percebi que toda aquela empolgação inicial do meu avô começou a ficar inversamente proporcional a minha, e como eu já havia dito, meu avô muda de ideia como quem troca de camisa. A apenas quatro dias do embarque, ele simplesmente desistiu da viagem!!! Argumentou que já estava muito velho e que não aguentaria o pique de uma viagem para tão longe, por tanto tempo fora de casa, eu, em choque, tentei reanima-lo, disse que o seguraria por onde quer que fosse, como fiz em Barcelona anos antes, que seria um passeio inesquecível, mas infelizmente meu avô estava irredutível. Foi a 1ª vez em 82 anos que ele recusaria/cancelaria uma viagem. Entretanto, de cara ele deixou claro que eu deveria fazer a viagem sozinho, pois afinal de contas já estava tudo pago e não teria porque eu não ir. Obvio que eu aceitei, mesmo triste com a decepção de não dividir com meu avô um antigo sonho de conhecer o Oriente Médio, eu deveria seguir o meu caminho, porque assim é a vida.

Passado um pouco o choque, comecei a matutar e pensei: bem, já que está tudo pago, e está tudo pago para duas pessoas, não tem porque eu ir sozinho, já que tem uma “vaga” sobrando, eu posso muito bem levar alguém comigo! Acho que qualquer pessoa em sã consciência aceitaria esse convite inusitado, mas a duvida cruel seria: quem convidar? Para meu alívio, o destino mais uma vez tratou de orquestrar uma sinfonia a meu favor, e me dei conta de que três dias não seriam suficientes para qualquer pessoa obter o visto de entrada nos Emirados Árabes (15 dias no mínimo seriam necessários), porém, para nossa alegria, o meu melhor amigo, Pedro Bogado, é também cidadão português, e europeus tem entrada livre nos EA.

Peguei o telefone e liguei. Segue o diálogo:

Eu: fala Mano!! Tudo bem?

Ele (num tom de voz baixinho e abatido): tudo.

Eu: ta onde?

Ele (baixinho): na biblioteca, estudando que nem louco!

Eu: então sai daí. (pausa). Então, por algum acaso você tem prova nas próximas semanas?

Ele: não.

Eu: e por algum acaso aquele seu passaporte estrelado (europeu) está com a data de expiração em dia.

Ele: tá, por que?

Eu: porque você deve sair daí agora, e ir pra casa arrumar sua mala pois depois de amanhã a gente vai pra Dubai!!!!!

Ele (após um silêncio de 3 segundos e gaguejante): O Q-Q-QUÊ? CO-COMO ASSIM? TU TA MALUCO?

Eu: Meu avô desistiu e vou leva-lo no lugar dele, topa?

Ele: calma cara, to zonzo, daqui a pouco te ligo.

 

E assim foi formalizado o meu convite, automaticamente compelido a ser aceito. Alguns minutos depois ele me ligou para que eu explicasse direitinho. Ele não conseguia parar de rir e claro que aceitou, mas antes precisaria comunicar a sua namorada que faria aniversário em algum dos 15 dias que estaríamos fora, o que poderia causar-lhe algum transtorno. Para nossa alegria, ela foi totalmente compreensiva e o apoiou a embarcar nessa aventura árabe. Na anti véspera do embarque eu ainda tive que me descabelar na agência de turismo para pedir o reembolso da passagem do meu avô para então poder comprar a passagem dele (parece idiotice o que disse, mas para quem não sabe, passagem aérea é pessoa e intransferível, logo esse foi o recurso viável, trocar seis por meia dúzia).

O dia 12 de outubro chegou, e como numa brincadeira de criança, eu e meu melhor amigo embarcamos para uma das maiores aventuras de nossas vidas, definitivamente a mais distante de casa e sem dúvidas a mais extraordinária. Após esses dias de doido correndo atrás de fazer tudo acontecer, finalmente eu pude sentar (deitar) na confortável poltrona da classe executiva da Emirates (poltrona que seria do meu avô) e relaxar durante as 14 horas seguintes.


sexta-feira, 31 de maio de 2013

Aah Le Leste [parte 2]: a logística não tem lógica

No passinho viajante, quero ver o Leste todo... Mas como? Por terra, água ou ar? Essa é uma boa pergunta que me fazem com bastante frequência: "Leeeo, o que é melhor pegar: avião, trem, ônibus, barco ou alugar um carro?" E minha resposta é sempre a mais sincera: "depende". Digo isso porque não existe resposta certa ou errada, e a mais adequada depende de uma série de fatores tais quais: orçamento disponível, número de acompanhantes, tamanho/quantidade de bagagens, tempo de viagem, valorização da paisagem, habilidade no trânsito, entre outras. Eu já viajei de praticamente todas as formas possíveis dentro do continente europeu, desde um burro-taxi, até um trem que vai por baixo d'água e outro que vai por cima dela! Após ter experimentado os elementos Ar, Terra e Água, dispenso o Fogo, e opto pelo Ferro(viário), e sem esquecer as lições do Capitão Planeta, não deixo de adicionar o 5º e mais importante elemento: o Coração! Perdoem-me o exacerbado romantismo ao encarar um simples "ir e vir" de uma viagem, mas acho que o segredo de escolher a melhor forma de locomoção está em saber desfrutar o melhor que cada uma das opções tem a oferecer. Amo viajar de trem, pelo seu bucolismo, pelo sentar frente a frente com 3 desconhecidos, pelo seu barulho de "piui tic tac piuiii", e principalmente pelo visual da sua janela "widescreen 64"" que faz inveja a qualquer TV de LED 3D junto com seu aparelho de Bluray. Não por isso deixo de desfrutar a velocidade do avião, o cheiro de mar ou o deslizar dos rios que o ferryboat proporciona, a independência do carro alugado, e até mesmo o balanço swingado dos burros das ilhas gregas ou dos camelos do deserto jordão. Já estou com a cabeça no Oriente Médio, e como diria o samba enredo de 1995 da Imperatriz Leopoldinense: "e balançou não deu certo não, pois não passou de ilusão. Eles trouxeram o balanço do deserto, mas não é gingado certo pra pisar no nosso chão"... Voltemos para Europa, aonde estou agora, mais precisamente em algum ponto da estrada entre a Áustria e a Eslovênia. E aproveito a ocasião para (re)contar como começou essa minha jornada no leste europeu, justamente pela Eslovênia, e espero que minha experiência de locomoção intra-europeia possa ajudá-los num futuro, e que seja em breve, afinal de contas, o verão europeu já está batendo à porta! Aaah o verão...Pois bem, ainda no Brasil, comecei a planejar minha viagem que teria início na Itália e Grécia, com minha família, para só então marchar rumo aos balcãs, mais precisamente, minha querida Croácia, a qual seria minha base para os 20 dias seguintes de viagem. Ocorre que o "ar" não tem muita lógica (financeiramente falando) e a melhor tarifa online que encontrei era referente às pernas: Rio - Roma - Milão (com "stop free" em Roma) / Zagreb - Paris - Rio (com escala de 8h30 em Paris). Ao analisar esses trechos, vocês perceberão "buracos", e eles foram deixados propositalmente, pois as outras cidades a serem visitadas eu optei por fazer por outras vias. Veneza eu optei por chegar de trem: a estação Santa Lucia te deixa na porta da parte "aquática" de Veneza, onde dali em diante quem domina são os gondoleiros e os habilidosos capitães de barcos. E em Veneza, após 3 dias, colocaria minha vó dentro do avião de volta para o Brasil, e depois seguiria num trem da madrugada para a capital croata, tal qual havia feito anos atrás. Porém, no momento em que meu tio e minha tia entraram na viagem, os planos tiveram de mudar (se lembram do "depende"???). A matemática é simples: quatro pessoas são mais que duas, e DEZ malas são muito mais que duas! Antes de viajar, eu, talentosa e precavidamente, tinha convencido minha vó a levar somente uma bagagem, ciente de que seria eu a carregá-la, além da minha, que por menor e mais leve que seja, não deixa de ser um volume. Contudo, com a entrada dos meus tios nos planos, foi tudo por água abaixo!! Minha tia levou tanta coisa que quase pagou excesso de bagagem na IDA... Medalha de Triunfo ao Excesso para uma necessaire com 18 PINÇAS!!! Por favor amigos, chamem o Sérgio Chapelin, pois isso é caso de "hoje no Globo Repórter: "a mulher que vai viajar quinze dias e leva DEZOITO pinças"... Acho que nem se estivéssemos indo para as florestas chinesas depilar ursos pandas dezoito pinças seriam necessárias. Enfim, os dias em Roma e Milão (sobretudo nesta) foram periclitantes no que tange o assunto volume de bagagem... E acreditem: as 18 pinças quase se tornaram 19, se eu não tivesse arrancado a tapas a 19ª das mãos da minha tia enquanto estávamos numa farmácia. Meu tio que não queria mais gastar com excesso de bagagem (pois já tinha gastado muito com o preenchimento das mesmas) sugeriu que alugássemos um carro em vez de irmos de trem, eu pensei em relutar, sabendo que o acesso de carro a Veneza definitivamente não é o mais indicado, e seria eu o motorista da rodada a resolver todos os imbróglios, mas ao me atentar para o fato de que seria o mesmo eu a me ferrar com o embarque e desembarque de 10 malas no trem e carregá-las Itália a dentro, aceitei na hora. Alugamos o maior disponível, um Peugeout 5008, que por pouquíssimo não foi grande o suficiente, e pé na estrada. Como eu acabei de dizer: carro e Veneza não combinam, e isso sempre foi assim e não vai mudar, portanto a não ser que você queira ficar no meio do fogo cruzado entre as placas de trânsito e o GPS, como eu fiquei, e nessa perder a única entrada para Veneza, e fazer o retorno quilômetros depois, não saber onde estacionar, e ao procurar o estacionamento sair pela única estrada de acesso a cidade (sem retorno) e ter que dirigir mais uns 30km por isso, e quando finalmente conseguir mais ou menos se encontrar, achar um carregador de mala com um carrinho especial para subir escada, que após atender a você e sua família queira desistir da profissão de anos, e quando finalmente estiver apto a devolver o carro, descobrir que o posto de entrega é fora da cidade, num ponto que o GPS não detecta e quando finalmente encontrá-lo, você lembrar que precisa abastecer o carro, faça como eu, vá de carro pra Veneza.Após visitar estas 3 cidades italianas, eu e meus tios seguimos para a Grécia, mas antes disso, no aeroporto, eu presenciei um dos maiores absurdos que eu já vi as companhias aéreas cometerem com seus clientes: o valor que meu tio teve que pagar de excesso de bagagem foi tão estratosférico que eu não tenho coragem de aqui revelar, e mais, nos colocou em dúvida se não seria melhor simplesmente abandonar algumas daquelas malas. Porém, quem não sabe brincar não desce pro play, meu tio pagou o que tinha que pagar e seguimos viagem, e no dia seguinte, eu teria uma ideia que só quem tem mais de 100 horas de check-in nas costas poderiaq ter, e que amorteceria bastante aquele rombo no orçamento do meu tio.Ao chegarmos em Atenas, com nossas infinitas bagagens, me dei conta de que um só taxi não seria suficiente, e então procurei e facilmente achei uma van executiva que nos levou confortavelmente até o centro da cidade, que é um pouco distante do aeroporto. Durante o trajeto, conversei bastante com o animado motorista e então tive uma idéia para facilitar toda nossa logística. A situação era a seguinte: ficaríamos duas noites em Atenas, depois voaríamos para Santorini onde passaríamos mais duas noites, para então retornar a mesma Atenas para pegar o vôo para Paris. Agora imaginem todo esse ir e vir em tantos poucos dias com infinitas bagagens? Na adversidade o homem desenvolve as melhores ideias e eu bolei com o motorista um plano pra deixarmos, a caminho do aeroporto, as maiores bagagens, no hotel em que ficaríamos na volta de Santorini, e do qual faríamos o check-out poucas horas depois de ter feito o check-in. Ok, ficou complicado de entender e/ou não pareceu tão brilhante assim, mas fato é que minha ideia parecia um pouco maluca de inicio, mas nos permitiu irmos para Santô bem mais leves, sem pagar excesso de bagagem e sem nem mesmo ter que despacha-las, orquestrei o milagre de fazer Tia Sylvia viajar com uma única bagagem de mão. Como já havia mencionado, em Paris me despedi dos meus tios, e segui viagem, rumo a Ljubjiana, capital eslovena, onde meu amigo croata Zuzu estaria me esperando. Lá passamos um agradável dia, passeando tranquilamente pelas ruas daquela bonita cidade, a noite fizemos o mesmo, e no dia seguinte, de carro, fomos para Zagreb. No caminho tivemos tempo ainda de parar para conhecer as Cavernas de Postojna, ponto turístico indispensável para quem visita a Eslovênia. E que eu tive a sorte de conhecer graças a flexibilidade de se estar com um carro a minha disposição (como disse, esta é sem duvidas a principal vantagem de viajar de carro, juntamente com você mesmo fazer seu horário).Após ter sido tratado como rei por 5 dias em Zagreb, era hora de sair da zona de conforto para poder "crescer" e conhecer e aprender mais, era hora de ganhar o leste, conforme já mencionei no post anterior, e apenas relembro agora para ressaltar a vantagem de estar viajando de carro, e no meu sortudo caso, estar com dois amigos locais que foram respectiva e simultaneamente, motorista e guia. Ao retornar da primeira etapa desta minha viagem pelo leste, composta de Eslovênia, Croácia, Bósnia e Sérvia*, decidi que era hora de sair ainda mais da zona de conforto, composta por: carro, motorista, guia e amigos, para trocar as estradas pelos trilhos, a liberdade de horario pelo apito de trem, as casas de amigos e hoteis pelos albergues. Hungria, Eslováquia e Áustria seriam os destinos.O trajeto Zagreb - Budapeste tinha duração prevista pra 6 horas, e trem costuma não atrasar quase nada, só que, naquele dia eu não dei sorte, e um pedaço da linha do trem estava em obra e eu tive que fazer uma senhora baldeação de trem-onibus-trem que somado ao tempo perdido na fronteira deu um total de 9 horas. A parte boa desta baldeação foi que ao desembarcar do primeiro trem fui abordado por uma brasileira que percebeu que eu era seu conterrâneo graças a bandeira miniatura que está estampada na minha mochila. Ela viajava com sua companheira e ter feito duas amizades brasileiras no meio do leste europeu foi legal, é sempre bom fazer amizades. Budapeste é uma cidade belíssima, com forte cultura e bastante interessante e tem como ponto alto os famosos banhos turcos, clubes com inumeras piscinas  e saunas com diferentes temperaturas. De lá, segui de trem para Bratislava, capital da Eslováquia, onde mais uma vez seria tratado com rei, por uma amiga que eu havia feito em Nice em 2010, e recebido a poucos meses no Rio de Janeiro. Ao desembarcar do trem, esbarrei num elegante senhor que falava ao telefone, pedi desculpas sem olhar para o seu rosto, e de repente ouvi: "Leo?!"... era o "Boss" (Sr. Miro) pai da minha amiga Dajana, que eu também tinha conhecido no RJ. Resumindo, se eu não tivesse esbarrado nele, ele jamais teria me visto pois estava distraído no celular, e tampouco eu o teria encontrado, uma vez que a Dajana era quem deveria estar me esperando na estação. Acasos do destino, que sempre conspira ao meu favor. Minhas horas na Bratislava foram agradabilissímas, mais uma vez tratado como rei, principalmente pelo Boss, que me adora tanto que chegou a declarar que o ponto alto da sua visita ao Rio foi quando eu os dirigia de volta pra copacabana e cantava Barry White... pruma pessoa curtir a minha voz é porque me adora muito.Para conseguir regressar a Zagreb, precisaria enfretar mais uma, e ultima, baldeação desta viagem: um ônibus até Viena, capital da Áustria, onde mais tarde naquele mesmo dia pegaria um outro ônibus para a capital croata. Minha amiga havia me garantido que não seria necessário se dar ao trabalho de comprar o ticket com antecedência, pois sempre sobravam muito lugares naquela linha de ônibus Viena-Zagreb. Por alguma intuição, eu não levei fé na sua tranquilidade, e não quis correr o risco de perder o último transporte do dia, caso contrário, só "amanhã de manhã", e eu tinha que estar de volta a Croácia naquele dia a noite. Conclusão, assim que cheguei a Viena decidi ir comprar meu ticket, chegando a bilheteria a mulher arregalou os olhos e perguntou quantos tickets eu precisaria, eu disse que apenas um e então ela sorriu aliviada, e me deu a notícia de que eu acabara de comprar o último assento daquele ônibus! Só me restou fazer o sinal da cruz e agradecer aos céus por ter me guiado até ali e principalmente por me permitir seguir a minha viagem até o destino final, sem atrasos ou contratempos.

ps: caso vocês tenham se intrigado com o trem subaquático que mencionei logo no início, se trata do TGV Londres - Paris que passa pelo túnel do Canal da Mancha. E caso tenham também se intrigado com o trem que vai por cima d'água, se trata de um que atravessa o mar entre o norte da Alemanha e a Dinamarca, dentro de um porão de um navio com trilhos no chão.                         





terça-feira, 14 de maio de 2013

Ahhhh Le Leste Leste Leste [parte 1]: girando girando prum lado, barrado barrado pelo outro.


Quem nunca sonhou em pegar um carro, um mapa (okaaay... GPS), juntar uns amigos e "hit the road Jack" sem muitos planejamentos, datas e destinos?! O sabor do vento e do desconhecio encantam a muitos, e eu que o diga! Ao longo desses ainda poucos, porém intensos anos de viagens, algumas vezes já vivi essa enriquecedora experiência, em exemplo: las vegas - california; new york - washington; dallas - oklahoma city; saint tropez - milão; e Jordânia de norte a sul. Cada qual com sua beleza e peculiaridade, e óbvio, o extraordinário que sempre me acompanha. E agora já era hora de colocar um velho desejo em prática: Leste europeu. Pois bem, a clássica forma de viajar pela europa é de trem, e eu já vivi isso de sul a norte, de oeste a leste, mas dessa vez optei por fazer diferente. A presença de dois grandes amigos em Zagreb (minha casa/base no leste) facilitou o plano, primeiro pelo desejo deles de viajarem comigo, e segundo por terem carro, e que no caso do Zuzu, era um senhor carro: um Audi S4 2013. A parte mais difícil do plano seria conseguir junto as suas respectivas namoradas, Ivana e Ozana, o "alvará de viagem", e a minha presença ajudou muito nesse plano. Elas não seriam cruéis ao ponto de barrar nossos ambiciosos planos de ganhar o leste quilometro a quilometro. E é bem verdade que as duas estariam ocupadas com os seus trabalhos, e nós, nem tanto assim: Zuzu é chefe e Ivan é autônomo. Então, beijo-tchau, até semana que vem e pé na estrada.
O nosso primeiro destino seria o Parque Nacional de Plitivice, e até foi, mas até a entrada, pois o céu fechado e a previsão de alta probabilidade de chuva fez com que desistíssimos de entrar. Por mais que lá fosse um local que eu gostaria muito de visitar desde 2010, conhecê-lo em um dia de chuva poderia ser decepcionante demais, e toda a beleza que eu já havia visto em fotos, eu continuaria sem ver ao vivo, então que ficasse algo pendente, e que sirva de desculpa para voltar um dia. Um pequeno pitstop para beber alguma coisa e brindar o destino exercendo sua força, ou simplesmente, como Zuzu tinha me ensinado, um brinde "sem razões". Rumo a Split.
Minutos antes de chegar a Split, a Ivana (namorada do Zuzu) nos enviou uma mensagem sms dizendo que tinha acabado de ver na internet que aquele dia era feriado em Split e por conta disso um grande festival estaria acontecendo. Como disse, era o destino agindo ao nosso favor, uma vez que caso tivéssemos entrado em Plitivice, demoraríamos pelo menos uma 5 horas para completar o tour, e mais as duas horas de estrada, certamente perderíamos o tal festival. Nossa chegada lá foi muito tranquila, com facilidade encontramos o aconchegante apartamento que havíamos alugado (por um preço irrisório) e logo partimos para a rua. Estávamos no lado alto da cidade, e conforme fomos descendo a escadaria toda a beleza de Split foi se revelando, e naquele dia em especial, contemplada pela presença de milhares de moradores e visitantes na rua principal, a beira-mar, comendo, bebendo, dançando e ouvindo a música ao vivo que rolava no palco. Por lá ficamos, no mesmo clima de felicidade e alegria, sentados numa mesa de bar (que conseguimos com muita paciência) até tantas da madrugada. Nesse meio tempo deu ainda pra passear pelos pontos turísticos de Split, ponto alto para a nova orla recém construída e o castelo e igrejas da cidade velha.
No dia seguinte partimos para Dubrovnik, segunda maior cidade croata, e importantíssima na história do país, principalmente pelos fortes ataques sofridos durante a guerra. Mas antes de chegar propriamente dito a Dubrovnik, tivemos que cruzar a fronteira, e duas vezes, isso porque a Bósnia possui um estreito acesso ao mar, que acaba cortando a Croácia, ou seja, saímos e voltamos para ela num intervalo de 20 minutos. Mas isso era detalhe, o mais importante era o visual daquela estrada a beira-mar pela qual dirigíamos. Como é bonita a costa croata! Depois de Zagreb, isso foi o que mais me encantou neste país, ao chegar em Pula, vi uma das paisagens mais deslumbrantes da minha vida, e ao descer o litoral, ficava cada vez mais incrível. Mais uma vez, Ivan, que possui imenso know-how turístico, já havia desenrolado um excelente e barato apartamento para ficarmos, na cidade vizinha de Mlini, que possuia uma praia "de cinema": mar azul e cristalino, sem uma onda, praticamente deserta, e um sol de primavera fechando o visual. Por ali ficamos algumas horas naquele "dolce fa' niente" croata. Ao cair da tarde pegamos um ônibus para chegar de fato a Dubrovnik, que ficava do outro lado de uma alta montanha, que nos deu uma vista digna de capa de revista de turismo, como quase tudo nesse país. O fim do dia foi pacato, mas não menos agradável, sentamos e um dos restaurantes no entorno da baía, onde havia um gigantesto barco de madeira a vela típico da região e na montanha ao fundo, um bondinho que servia de ligação entre as partes alta e baixa da cidade. Regados a vinho e uma panela repleta de frutos do mar terminamos mais um dia de viagem.
A Croácia tava boa demais, mas o "album" já havia sido completado, e suas principais cidades já haviam sido visitadas, se juntasse 2010 com 2013; era hora de cruzar (novamente) a fronteira e conhecer um dos países mais peculiares do globo terrestre: Bósnia-Herzegovina. Só o seu nome já chama atenção, sua cultura e história então, têm grandeza inversamente proporcional ao seu pequeno território. No instante em que se cruza a fronteira, imediatamente se percebe estar em um outro país, as estradas de lá são bem ruins, nelas se perde pelo menos o dobro do tempo que se perderia na mesma distância se estivesse numa estrada croata, mas nada que fosse atrapalhar nossa road trip, afinal de contas, tempo era a principal coisa que tínhamos, só não tínhamos tempo a perder. Na nossa primeira parada na Bósnia, na beira da estrada, Zuzu recebeu uma ligação de um amigo de um amigo que tinha visto o seu check-in no facebook e gostaria de nos encontrar para tomarmos um café e nos mostrar os arredores daquela região, claro que aceitamos, e em poucos minutos em solo bosnio, já estava eu, andando com os locais, indo a lugares onde turista algum ousa ir. Ele nos levou, cheio de orgulho, para o galpão onde ele estoca o couro que exporta para diversos lugares do mundo. O cheiro era horrível, mas valeu conhecer, vai que um dia eu preciso importar couro. E de todo modo ficava num local bem alto, que nos deu uma bonita vista. Como cheirar couro secando não era nosso principal desejo na Bósnia, partimos para Sarajevo nosso verdadeiro destino. Ao chegar a capital, pudemos de cara perceber as marcas da guerra, tão recente, e a de certa forma precária infra-estrutura de lá (confesso que sendo do Brasil, fiquei menos impactado do que eles dois).
Nosso hotel, três estrelas, superou nossas expectativas, apesar da chegada não muito agradável, uma vez que a recepção queria exigir que nossos passaportes e a chave do carro (estacionado no estacionamento do hotel). Uma importante informação sobre a Bósnia: lá as coisas não têm lógica, e perdoem-me, mas não tem muito como explicar, só na pele pra entender, mas essa situação do hotel é um bom exemplo. Felizmente conseguimos desenrolar para que o passaporte, que é documento pessoal, intransferível e propriedade do governo do seu respectivo país, ficasse conosco, mas a chave do seu querido Audi S4, teve que ficar lá, para infelicidade do Zuzu, e deleite meu e do Ivan, que tratamos de colocar pilha nele dizendo que veríamos o carro dele por todos os cantos de Sarajevo, pilotado por todos os funcionários do hotel (ok, não eram tantos assim).
No nosso primeiro bater de perna pela cidade, o que mais chamou minha atenção foi o mix cultural de lá, deveras incrível: muçulmanos, descentendes de russos ortodoxos e sérvios cohabitando aquele mesmo local. Cada prédio que se olhava possuia uma influência diferente, cada restaurante com sua própria culinária, e diversas igrejas e mesquitas construídas quase que lado a lado, dividindo espaço pacificamente. Já na parte mais moderna da cidade, estavam diversas lojas de marca, e muitos restaurantes e bares, muito bem arrumados, e com uma população bonita e vibrante aproveitando o final do dia.
Mas o que Sarajevo me guardou de melhor e mais enriquecedor veio na manhã do dia seguinte: um tour pelo Túnel da Vida (ou Esperança). Para os que não sabem, assim como eu não sabia (tão detalhadamente) até então, ainda no contexto da dissolução da Iugoslávia, no ano de 1992, a Bósnia se declarou independente, para muito contragosto das forças integralistas sérvias (governo que tinha ambições de formar a Grande Sérvia). Foi então que este exército (o quarto maior do mundo naquele momento) marchou para os arredores de Sarajevo, cercando-a e impondo terror à sua população. Durante 3 anos os bosnios eram proíbidos de entrar e sair de sua própria capital, e até mesmo de transitar nela, uma vez que atiradores de elite ficavam permanemtemente instalados nos altos das montanhas ali perto e atiravam aleatoriamente em qualquer coisa que se movimentasse (a crueldade dos soldados sérvios era tão grande, que há registros de que eles alugavam seus fuzis para "turistas", tão ou mais cruéis ainda, para atirarem do alto da montanha em direção a cidade). Uma das "soluções" para amenizar o impacto de se viver numa Sarajevo sitiada foi a construção de um tunél subterrâneo e artesanal, de 800m de extensão e quase nada de largura e altura, para o transporte de comida e medicamento, que eram doados por alguns países e pela ONU. Contudo, a qualidade e validade destes eram duvidosas, alguns suplementos datavam da Guerra do Vietnã. Tudo isso nos foi explicado nos arredores do Sarajevo International Airport, por uma guia que viveu tudo isso na pele, e eu juro que não sei como ela conseguia contar aquela história para nós sem se emocionar, pois eu, àquela altura já estava me debulhando em lágrimas. Ao final do documentário que estava sendo exibido, descemos num trecho do túnel, e aquela energia, negativa sim, mas também repleta de esperança e luta pela sobrevivência, eu jamais havia sentido em local algum do planeta. Por fim, eu tive o imenso prazer de conhecer o Sr. Abda, soldado bosnio, que durante semanas dirigiu um caminhão carregado de explosivos, com os faróis desligados (para não ser visto pelos soldados sérvios), nas estreitas e precárias estradas de terra do alto da montanha que ficava ao norte de Sarajevo, e era considerada território livre. O exército da Bósnia era pífio perante o da Sérvia, eles tinham que tentar de tudo e contar com a bravura e a honra dos seus soldados para conseguir o mínimo de defesa para sua população e território, o Sr. Abda foi um desses homens, um desses heróis, que eu tive o prazer de olhar no olho e dizer que ele tinha todo o meu respeito, e pude ainda apertar a sua mão e fotografar este momento que pra sempre guardarei na minha memória. O primeiro presidente da Bósnia-Herzegovina, Alija Izetbecovic, declarou com excelente precisão: "Uma vez que a análise for feita, e quando o milagre da resistência bósnia for decifrado de um ponto mais distante na História, será então compreendido - e eu estou certo disso - que o seu segredo estava em algum lugar da alma ou do caráter de sua população". E de fato é incrível, como aquela população é capaz de sorrir e até mesmo fazer piada com um sofrimento tão brutal e recente. Ao entrar no carro, já pra voltar ao hotel, uma abelha acabou entrando junto, para o semi pânico da guia, e eu peguei a abelha e joguei ela pra fora da janela, foi quando a guia disse: "você é muito corajoso!". Primeiramente eu gargalhei, e depois eu falei: "Você passou por situações que eu jamais imaginei que fossem capaz de sequer existir, e hoje você está aqui contando a sua história e a do seu país, e ainda o fez com um sorriso no rosto, portanto, acredite, corajosa é você, espantar uma abelha não é nada comparado com a forma que você espantou o trauma de uma guerra". Ela sorriu com certo orgulho, e encerrou o assunto com uma piada: "Essa resistência e força o povo bósnio adquiriu com os biscoitos da Guerra do Vietnã". Naquele dia, ainda deu tempo de passar pela esquina na qual o Arqueduque Austro-Hungaro Franz Ferndinand e sua esposa Sofia foram assassinados, o que por muitos historiadores é considerado o estopim para a Primeira Guerra Mundial.
Ao meio-dia em ponto resolvemos partir e após fazer o check-out no hotel, o carro de Zuzu de fato não estava onde ele havia estacionado, para a gargalhada geral, felizmente o tanque ainda tinha gasolina e todos os pertences estavam lá dentro e o carro aparentemente estava nas mesmas condições de antes. Sendo assim, era hora de partir para nosso próximo destino, Belgrado, capital Sérvia.
Nós três estávamos bastante empolgados, uma vez que Belgrado é considerada uma das capitais mais animadas do continente europeu, e o Ivan em especial, estava muito satisfeito em realizar, através da minha visita, um antigo desejo, pois os seus amigos croatas jamais gostaram da idéia de visitar a Sérvia (antigo rival de guerra). Foram 6 longas horas de estrada (péssima) até a fronteira, e lá esperamos mais uns 30 minutos, para então sermos informados de que não poderiamos adentrar o país, pois o Senhor Leonardo Cerqueira não possuia visto de entrada para a República Sérvia, e na condição de brasileiro tupi-guarani era condição sine qua non. Foi a clássica situação "rir pra não chorar", Ivan "chorou", eu e Zuzu (uma das pessoas mais positivas e de bem com a vida no mundo) rimos, rimos muito. Ele disse: é incrível como você já deu a volta em meio mundo e foi ser barrado aqui na Sérvia... esses sérvios são realmente uma piada. Ivan seguia num silêncio de dar pena, e eu falei: "quer saber?! FUCK SERBIA!", pra ser sincero, depois de todas as histórias que ouvi dos meus amigos croatas e dos bósnios sobre a guerra dos balcãs, eu tomei certo repugno por lá, e tentei ver a situação pelo lado do destino exercendo sua força (sempre ao meu favor). Tentei consolar Ivan dizendo que tudo acontece por uma razão, e que com certeza algo ruim estaria por nos acontecer em Belgrado e/ou algo de maravilhoso estava pra nos acontecer no próximo destino (que naquele momento não sabíamos qual seria). E aconteceu.
Demos meia volta e paramos no primeiro posto de gasolina que vimos. Começamos a debater sobre as possibilidade de pra onde ir depois de 6 horas de estrada e um carimbo de recusa no passaporte. Duas cidades despontaram como candidatas: Banja Luka (Bósnia) e Osijek (Croácia). Começamos a ponderar sobre os prós e contras de cada uma delas, e foi então que eu decidi por nós três, seguindo uma das principais lições ensinada por minha mãe: "Meu filho, quando você não tiver o que falar, fique em silêncio; quando não tiver o que fazer, coloque as mãos no bolso; e quando não tiver pra onde ir, volte pra casa". Era o que precisávamos fazer depois de dias na estrada e a recusa de entrada em um país, precisávamos voltar pra nossa casa, precisávamos voltar pra Croácia! Cruzamos novamente a fronteira bosnia, e uns 40 minutos depois cruzamos a fronteira croata... o ar era outro, a estrada era outra, o clima era outro, a tristeza e decepção ficaram pra trás, e dali em diante seria só felicidade novamente. Pedi que o Ivan fizesse uma reserva no melhor hotel de Osijek (que eu tinha quase certeza que não seria muito caro), e que eu faria questão de arcar com todas as despesas daquela noite, afinal de contas, era eu o culpado por não estarmos em Belgrado. Uma boa noite de sono seria importante para recuperarmos a energia daquele dia sem fim, e para principalmente aproveitar o dia seguinte, que haveria de ser melhor! E foi.
O plano para o dia seguinte era passar na cidade em que o Zuzu mora, Bjelovar, que ficava no caminho de Zagreb. Porém, pra variar, o telefone dele tocou e mudou nosso planos, para melhor, muito melhor. Aquele dia era também feriado, e um grande amigo seu, Mario, nos convidou para um churrasco na sua casa. Decidimos ir, só para dar um alô mesmo, pois o plano era de fato ir para Bjelovar. Ocorre que, chegando na casa do Mario, encontramos um ambiente extremamente alegre e familiar, crianças correndo no jardim, senhores e senhoras brindando, os jovens entretidos com a churrasqueira que girava um carneiro de 40kg e muita música típica. Assim que pisamos lá percebemos que aquela era a coisa maravilhosa que o destino que conspira sempre ao nosso favor havia nos guardado. Se Belgrado nos recusou, Osijek nos recebeu de braços abertos. Foi uma tarde de muita alegria, risada, gargalhada, comida e, porque não, bebida. Até eu que não sou muito do "esporte" tratei de afogar as mágoas sérvias, e lavei a alma com vinho e whisky e como sempre, fui feliz em solo croata, em casa. No final da tarde, a natureza ainda nos contemplou com um show, uma chuva de granizo que durou cerca de 10 minutos, embalada por canções de exaltação à pátria, cantadas por Zuzu e o pai do Mario, Sr. Miro, que naquele momento, sem falar uma só palavra de inglês, me agradeceu, através da tradução de Zuzu: fico honrado e agradeço a visita de alguém que veio de tão longe, lá da Austrália (nós: Não!)... digo, lá do México (nós: Nããão!)... quer dizer, lá do BRASIL! (nós: Amém!) E ano que vem estaremos lá na Copa do Mundo!!!"
Naquela noite fomos ainda para um bar pra eles beberem mais (eu já tinha parado há muito tempo), e jogarmos dardo, comer, bater papo e continuar a diversão. Dormimos na casa de um amigo do Mario e na manhã seguinte voltamos para Zagreb, onde teríamos ainda um outro almoço em família para comemorar o dia das mães e o aniversário de 85 anos da querida avó do Ivan. Mais uma tarde feliz, em família e que nos deu a certeza de que viajar é muito bom, mas voltar pra casa é melhor ainda.




















quarta-feira, 1 de maio de 2013

Kiss and fly, kiss and cry

Há 5 dias, minha vó em Veneza, hoje, meus tios em Paris, Esses foram os dois únicos pontos baixos da minha viagem: ter que me despedir deles. Eu sou péssimo com isso, e acho que nem no meu centésimo aniversário terei já aprendido.
O que é a vida senão a arte do encontro, que de forma resumida se inicia num "oi" e termina num "tchau"? Como é difícil esta segunda parte... e em se tratando de viagem ela se intensifica e multiplica. Se multiplica mais no caso de viajar sozinho, quando você faz muitas amizades em cada local que se vai, e a cada partida é uma sessão de "tchaus" sem saber quando dará "oi" novamente. Se intensifica no caso de viajar em amigos ou família, onde o convívio se aprofunda a tal ponto de burlar a privacidade e a individualidade de cada um. Contudo, no momento de dar tchau, só ficam as coisas boas, e os momentos ruins (que no meu caso foram nulos) apesar de abstratos, se esfarelam e viram poeira no ar.
A história dessa primeira parte da viagem, se desenhou quando, primeiramente, atendi a um pedido da minha vó, e num segundo momento, adicionei a comemoração de bodas de prata dos meus tios. Devido a minha experiência em viagens e know-how de internet, hoje ferramenta indispensável, fui eu a tomar a frente de TUDO. Em poucos momentos da minha vida me senti tão responsável por tudo, para todos, durante tanto tempo. Nunca tinha sentido alguém tão dependente de mim como senti nesses dias (nenhum deles falava italiano, grego, ou até mesmo inglês), e dessa vez foram logo 3 pessoas de uma vez só... acho que pela primeira vez na vida senti mais ou menos o que é ser pai.
E aí, quando você se vê mergulhado de cabeça numa experiência dessa, e sendo perfeccionista como sou, a minha vontade era de levar minha vó até a porta de sua casa, e meus tios até, pelo menos, os seus respectivos assentos no voo para o Rio. Mas infelizmente isso não foi possível, e tive que me contentar com as clássicas despedidas de aeroporto, e que do meu abraço em diante, Deus cuidasse dos passos deles. Da minha vó me despedi no aeroporto de Veneza, e conforme a barreira do raio-x ia se aproximando, meus olhos se enchiam de lágrimas e para adiantar aquele sofrimento eu fui apertando o passo. Até que finalmente ela me abraçou apertado, me agradeceu profundamente por aqueles dias e o nosso choro desceu. Quando ela chegou ao Rio, nos falamos por telefone e ela me contou toda orgulhosa sobre o seu desempenho ao fazer a conexão em Roma, mesmo eu não estando presente.
Com meus tios foi um pouco mais fácil e graças ao frenesi do aeroporto CDG de Paris, economizei alguns lencinhos de papel. O meu plano era deixá-los na porta do voo 444 para o Rio, para só então buscar o portão de embarque que me levaria, horas depois, para o meu próximo destino. Todavia, o voo deles era para fora da União Europeia, e exigia a passagem pelo controle de passaporte, diferentemente de mim. Sendo assim, nosso "beijo e tchau" se deu ali, de repente, e não deu tempo nem das lágrimas escorrerem. De lá segui meu caminho eu fui buscar o meu portão.
No aeroporto de Nice tem uma placa que diz o seguinte: Kiss and Fly, que indica para onde devem ir os carros de pessoas que iram embarcar, mas sem que o motorista estacione, o famoso "beijinho beijinho, tchau tchau"... no meu caso essa placa poderia dizer "kiss and fly, kiss and cry", pois em toda despedida que tiver como as duas que tive nos últimos 5 dias, com certeza eu vou chorar, mas não sem esquecer de sorrir pelas memórias que construímos e as gargalhadas que iremos dar ao relembrá-las quando juntos estivermos novamente.
A dica é essa meus caros, aproveite cada minuto com os seus companheiros de viagem, seja um novo amigo ou um parente, pois num piscar de olhos já será hora de dar tchau, e então, só ficarão as boas recordações e a saudade... trate de criar muitas delas.